quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Julgamento de Camilo Castelo Branco e Ana Plácido


Julgamento de Ana Plácido e Camilo Castelo Branco



Ana Plácido em jovem
No dia 15 de Outubro de 1861, deu-se início ao julgamento de Ana Augusta Plácido e Camilo Castelo Branco, que terminou no dia 17 do mesmo mês. Decorreu no Tribunal Criminal do Porto, na então Travessa da Picaria, um arruamento que não existe mais — hoje é o lado norte da Praça de Filipa de Lencastre, gaveto com a Rua da Picaria, onde já esteve instalado o Restaurante Portuense (actualmente, existem no mesmo espaço estabelecimentos comerciais da área da restauração).


O processo foi entregue ao juiz José Maria de Almeida Teixeira de Queirós, pai de Eça de Queiroz, que posteriormente foi substituído (diz-se que Manuel Pinheiro Alves, sabendo-o amigo do casal, conseguiu que ele fosse transferido para Vila Franca de Xira). Mas, voltando ao julgamento, de que estavam de facto acusados os réus?

Ao abrigo do artigo 401 do Código Penal da época, eram acusados do crime de adultério. O artigo dizia:



«O adultério da mulher será punido com o degredo temporário.

1. O co-réu adúltero, sabedor de que a mulher é casada, será punido com a mesma pena, ficando obrigado às perdas e danos que devidamente se julgarem.

2. Somente serão admissíveis contra o adúltero as provas de flagrante delito ou as provas resultantes de cartas ou outros documentos escritos por ele.»



            De seguida, transcrevemos ipsis verbis a informação disponível acerca deste processo e que pode ser consultada na página do Museu do Tribunal da Relação do Porto, vulgo Tribunal de Justiça:



«Por queixa de Manuel Pinheiro Alves, marido de Ana Augusta Plácido, foi instaurado processo de querela, por adultério, contra Camilo Castelo Branco e aquela Ana. O processo foi objecto de despacho lavrado, em 22 de Dezembro, pelo juiz José Maria de Almeida Teixeira de Queirós, pai de Eça de Queiroz, titular daquele Tribunal Criminal, sito na Praça D. Filipa de Lencastre, na esquina com a Rua da Picaria. A queixa foi assinada pelo advogado Alexandre Couto Pinto e os acusados tiveram como defensor Marcelino de Matos que também havia de defender, noutro processo, o  Zé do Telhado.

​Camilo e Ana acabaram por ser pronunciados, ela por adultério e ele por ter copulado com mulher casada, por decisão do Tribunal da Relação do Porto, já que o juiz Queirós apenas pronunciara a Ana. Isto por que só o adultério da mulher era punível e, relativamente ao homem comparticipante, a punibilidade pressupunha o flagrante delito (sós e nus na mesma cama) ou a existência de cartas ou outro documento escrito. O flagrante não se verificava e apenas existia uma carta dirigida a um tio (informador de Pinheiro Alves da infidelidade da mulher) de Ana, mas em que não era mencionado o nome desta. Na sequência da pronúncia, Ana Plácido e, mais tarde, Camilo recolheram à Cadeia da Relação. Depois de muitos incidentes (pedidos de escusa de juízes, recursos), chegando o processo a subir ao Supremo Tribunal de Justiça, foi efectuado o julgamento, num ambiente extremamente emotivo, correspondente à grandiosidade do escândalo. Estava ao rubro a curiosidade das provectas virgens, das matronas desocupadas e dos conquistadores frustrados, além dos seráficos moralistas de fachada. Se a Relação ultrapassara a desadequação legal à evolução se senso comum, pronunciando ambos os Réus, considerando que “seria um contra-senso inqualificável que esse homem que a teve teúda e manteúda já nesta cidade na Rua da Picaria, já em Lisboa e na Foz: que a foi tirar ao Convento da Conceição em Braga aonde se achava, para assim continuar com ela uma vida de escândalo e imoralidade que afecta a sociedade em geral ficasse impune...”, o júri, acaba, de forma oposta, por tornear aquela desadequação, não considerando provados quesitos fundamentais. A sentença, proferia em 17 de Outubro de 1861 (peça que, presentemente, não se encontra no processo por ter desaparecido), limitou-se a absolver os acusados e emitir mandados de soltura.»



 advogado de defesa de Camilo foi o Dr. Marcelino de Matos (1824-1868 ( é bem,1865 )), que viria a ser pai do Dr. Júlio de Matos (1856-1922), pioneiro da psiquiatria em Portugal.




A pedido de Camilo, este jurista defenderia, mais tarde, Zé do Telhado, que se livrou da forca, de facto, mas foi condenado a 15 anos de degredo na então chamada África Ocidental Portuguesa (Angola).

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