FUNDAÇÃO DO FUTEBOL CLUBE DO PORTO
FUNDAÇÃO DO FUTEBOL CLUBE DO PORTO
Existe uma polémica em torno da
data de fundação do Futebol Clube do Porto. O clube foi fundado em 1893 ou em
1906, como durante anos se afirmou?
De notar que, e até aos anos 80
do século XX, as histórias sobre o Porto diziam, e o próprio clube assumia essa
realidade, que a data de fundação tinha sido em 1906.
Mas nos anos 80 e numa
investigação encetada por Rui Guedes, para fazer a Fotobiografia do Futebol Clube
do Porto, este descobriu uma certidão em que apontava o dia de 28 de Setembro
de 1893 como a data fundadora do clube. Tinha sido António Nicolau de Almeida o
fundador e tanto a data da fundação assim como a cor das camisolas que os
atletas iriam daí por diante ostentar não era inocente.
António Nicolau de Almeida (1873-1948)
foi um negociante de vinhos, juntamente com o seu pai, e era ao mesmo tempo um
apaixonado pelo desporto. Um sportsman, como na época se dizia.
A sua primeira paixão foi a velocipedia
e numa revista da época podemos ler a seguinte notícia:
«Já em 1891 e 1892 um grupo de
rapazes, entre os quais António Nicolau d´Almeida, Fernando Nicolau d´Almeida,
Vieira da Cruz, Lacy Rumsey, Artur Rumsey e George Dagge, vinha trabalhando
afincadamente a favor da velocipedia. No primeiro ano, sob o nome de Clube
Excursionista, e, seguidamente, em 1892, sob nova designação de Clube de
Velocipedistas do Porto, tentam levar a efeito passeios e excursões em
bicicleta, algumas corridas, fazendo uma boa propaganda à custa do seu enorme
entusiasmo. Àqueles vêm juntar-se outros. Eduardo Rumsey, António Leite de
Faria, António Tasso de Sousa, Benedito Ferreirinha, Carlos Rothes, Guilherme Andersen,
Pedro Amorim Júnior, Caetano Marques Rodrigues, Carlos Chambers e Jorge Nunes
de Matos, completam o grupo dos apaixonados do pedal. O entusiasmo cresce, e,
finalmente, o Velo Clube, pela junção de 44 sócios, ao Clube de Velocipedistas
do Porto, passa a usar a designação de Real Velo Clube do Porto, que tinha as suas
instalações no Palácio de Cristal. Durante o segundo semestre de Alteza o
Senhor Infante D. Afonso e, em fins do mesmo 1893 entram muitos sócios, entre
os quais figura Sua ano, Sua Majestade El-Rei concede a quinta do seu palácio
da Rua do Triunfo para construção do velódromo, mostrando bem assim o grande
interesse que as coisas de sport lhe mereciam.»
A quinta que a notícia se
refere é o actual Museu Nacional Soares dos Reis, que durante muito tempo
pertenceu à família real, era então chamado Palácio dos Carrancas.
Além do ciclismo, Nicolau de
Almeida praticava remo e natação.
Em 1893 e depois de uma viagem
de negócios à Inglaterra o "nosso" sportsman veio entusiasmado com o
jogo que por lá estava na moda. O futebol, e tão entusiasmado estava que com
alguns amigos funda no dia 28 de Setembro de 1893 o” Football Club do
Porto", assim mesmo, com a grafia inglesa como na época imperava.
A data, 28 de Setembro,
coincidia com o dia de aniversário, tanto do rei D. Carlos assim como a rainha
D. Amélia e o azul e branco era a cor da bandeira nacional de então e como
Nicolau de Almeida era monárquico, na sua óptica tudo fazia sentido.
A revista de Lisboa, Diário
ilustrado, faz eco desta fundação e publica a seguinte notícia:
«Fundou-se, no Porto, um clube
denominado Foot Ball Clube do Porto, o qual vem preencher a falta que havia no
norte do país de uma associação para os jogadores daquela especialidade. No
segundo domingo de Outubro inaugura-se o clube oficialmente, com um grande
match entre os seus sócios, no hipódromo de Matosinhos. Ouvimos dizer que serão
convidados alguns clubmen de Lisboa. Que o Foot Ball Club do Porto apure um
grupo rijo de jogadores e que venha medir-se ao campo com os jogadores do Club
Lisbonense, do Real Ginásio Club, do grupo de Carcavellos ou de Braço de Prata,
para animar os desafios de Football como já o são as corridas de cicles. Eis o
que desejamos.»
Estava lançada a aventura, o
Jornal de Notícias da semana seguinte dá conta do facto e noticia o seguinte:
«Realiza-se hoje, às duas horas
da tarde, no antigo hipódromo um \'match\' de football, promovido pelo Foot
Ball Club do Porto, tomando parte nesta diversão vinte e dois sócios do
referido clube. Os dois partidos são \'capitaneados\' pelos srs. Nugent e
Mackenie, distintos jogadores e sócios do referido clube. Tomam parte os
senhores Fernando e António Nicolau de Almeida, Arthur, Lacy e Roberto Rumsey,
Alfredo e Eduardo Kendall, Guilherme Anderson, Wlater Mac Connan, Barbosa,
António Maria Machado, José Vale, Artur Ramos de Magalhães, Eduardo Sprakey, A.
Johnston, Hans Peters, Jorge Hardy, Joaquim Duarte, Henrique Cunha e A. Vieira
da Cruz, etc. Vêm assistir a este torneio as senhoras da colónia balnear da
Foz. Este interessantíssimo jogo é uma novidade no Porto e há grande
entusiasmo, tendo-se feito já algumas apostas.»
Clube Lisbonense |
Em 25 de Outubro
desse mesmo ano Nicolau de Almeida escreveu a o presidente do Clube
Lisbonense a convidá-lo para um “match”, este foi aceite e o jogo foi o 1º
encontro oficial do novel clube. O presidente do Clube Lisbonense era primo de Guilherme
Pinto Basto, o introdutor do futebol em Portugal.
Eis a carta
"Desejando solenizar a definitiva
instalação do Football Club do Porto, resolvemos organizar um “match” …
…Cumpro, pois, na qualidade de presidente do Football Club do Porto, o honroso
dever de convidar por intermédio de V. Exa. os valentes e adestrados jogadores
do Club Lisbonense a tomarem parte no referido "match". Na esperança
de sermos honrados com a anuência ao n/pedido, aguardamos o favor de uma
resposta rápida p.ª n/governo. Deus guarde V. Exa. Ilmo. Sr. Presidente do
Football Clube Lisbonense."
O grande jogo iria então realizar-se em
Março de 1894 e em honra do Rei Carlos I que não só ofereceu a taça, como fez
também questão de estar presente no Oporto Cricket and Law-Tennis Club, no
Campo Alegre. Pelos portistas, jogaram Mac Geoc, F. Guimarães, A. Nugent,
Arthur Dagge, Mac Millan, Ramos, Mackechnie, R. Ray e Alfredo Kendall. O FC
Porto perdeu por...1+1. Bem, a corte atrasou-se e quando se instalou no
"camarote" improvisado já o Lisbonense vencia por 1-0. Decidiu-se que
se iria jogar mais trinta minutos e a equipa do sul marcou mais um golo, rezam
as crónicas. Por 1 ou por 2, a Taça del Rey foi com os visitantes:
O Porto ainda fez mais dois jogos, um
deles contra uma equipa de Aveiro, onde pontificava Mário Duarte, avô de Manuel
Alegre, e pouco depois o entusiasmo esmoreceu. Porquê
Nicolau de Almeida, entretanto casou com
Hilda Rumsey, irmã dos seus colegas de clube, Arthur e Lacy. Hilda não gostava
de futebol, achava-o um desporto rude e agressivo, preferindo o ténis, assim
conseguiu convencer Nicolau de Almeida a retirar se do clube entrando este num
marasmo e estagnação.
Só em 1905 é que o Porto voltaria a jogar,
desta feita com o Lisbon Cricket Club, ganhando este último por 5-2.
Nicolau de Almeida - Romualdo Torres e Monteiro da Costa |
Em 1906 Monteiro da Costa relança a ideia
de revitalizar o clube e convida Nicolau de Almeida a regressar ao mesmo. Esta
recusa o convite e lança a ideia de Romualdo Torres, seu amigo e companheiro
das lides futebolísticas de antanho, o representar na nova direcção.
Em Setembro de 1906 Monteiro da Costa
refunda o clube e convida antigos jogadores, como Mackechnie, Rumsey, Wright e
ainda Ernesto Sá, - que antes de 1906 também jogara em Matosinhos, no tal
campo do Prado", a fazerem parte do mesmo.
Mas em abono da verdade alguns afirmam que
o FC Porto de 1893 e o de 1906 não têm nada a ver um com o outro. Como? Uma cidade
como o Porto, vai ter um clube em 1906 com o mesmo nome, a mesma cor na camisola,
com alguns jogadores da geração de 1893, com o convite endereçado a Nicolau de
Almeida para regressar ao clube, e isto tudo é coincidência?
Na História dos Três Grandes, oficialmente
“Glória e Vida de Três Gigantes “que o jornal “A Bola” publicou nos anos 90 do
século XX já se lançava pistas para a existência do clube antes de 1906, data
da refundação, lá, pode-se ler:
"Em 1906, seria refundado por
Monteiro da Costa, amigo de António Nicolau d'Almeida. Que se ligaria ao clube,
acompanhando alguns dos seus amigos que, para além do nome, lhe mantivera a cor
das camisolas (azuis e brancas) e a bandeira da Monarquia (...) alguns dos
jogadores do Football Club do Porto como Mackechnie, Nujent ou Kendall
alinharam, no Football Club do Porto refundado por Monteiro da Costa, em
1906".
António Rodrigues Telles que publicou uma
história do Futebol Clube do Porto em 1933, “História do Futebol Clube do
Porto, 1906-1933, vai se contradizer na mesma história ao afirmar:
"António Nicolau d'Almeida
fundou...o Futebol Clube do Porto, como a carta [a Guilherme Basto] assim nos indica. Da ligação
ao Futebol Clube do Porto de 1893 e o que nasceu em 1906 já se tiraram, por
certo, algumas conclusões, e outras mais podem surgir.(...) Também se sabe que
António Nicolau d'Almeida, afinal, acompanhou os homens do Futebol Clube do
Porto depois de 1906. Foi, portanto, um homem da nossa agremiação, aquele que
primeiro a sonhou! (...)
Em nossa opinião, esta necessidade de
apagar os anos do clube entre 1893 e 1906 prende-se com o ambiente político da
época.
Portugal tinha sofrido a humilhação britânico
plasmada no Ultimatum, ou seja, a Inglaterra proibiu Portugal de lançar para a
prática o famoso Mapa Cor de Rosa, a ligação entre Angola e Moçambique através
dos territórios que são hoje o Malawi e a Zâmbia. Por causa desta humilhação
tudo o que fosse inglês era mal visto, a Inglaterra era persona non grata para
os Portugueses. O rei D. Carlos devolveu as condecorações que os seus “primos”
britânicos lhe tinham dado. Tinha-se escrito um hino contra os ingleses, que
terminava com a estrofe “Contra os Bretões, Marchar, Marchar”, vinha aí o
futuro hino nacional.
Por tudo isto em nosso entender houve uma necessidade de apagar a
história recente que relacionasse a Inglaterra com Portugal e por isso a data
de 1893 foi apagada do imaginário portista até anos, anos 80.
Em face de tudo o que acima escrevemos, é meu entender que o Porto
foi fundado em 1893 por António Nicolau de Almeida e refundado em 1905 por
Monteiro da Costa.
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