COMO E QUANDO É QUE AS 15 FREGUESIAS DO PORTO FORAM ENTRANDO PARA A CIDADE INVICTA
O Porto das Freguesias, as Freguesias do Porto
Até aos finais do século xvi a cidade do Porto é constituída apenas por uma
freguesia, a da Sé.
Em 1583, o então Bispo do Porto, D. Frei Marcos de
Lisboa, com o argumento de uma melhor administração eclesiástica e pastoral,
divide a Sé em quatro novas freguesias: Sé, S. Nicolau, Vitória e S. João
Baptista de Belmonte, marcando-lhes os limites de uma forma tão rigorosa que
ainda hoje podemos fazer o levantamento toponímico através deles.
A freguesia de S. João Baptista de Belmonte foi efémera.
De facto, passados apenas quatro anos, foi extinta e a sua população distribuída
pelas freguesias da Vitória e de S. Nicolau. Com a pressão demográfica a
acentuar-se, a cidade começa a ter noção de que as muralhas começavam a ser um
espartilho quanto ao desenvolvimento da urbe. Esta situação obriga, então, à
criação de mais duas freguesias, estas já fora das muralhas: Miragaia e Santo
Ildefonso.
Em 9 de Outubro de1710 a Mesa Grande da Relação,
organismo do Estado que superintendia a criação de freguesias e municípios, amplia
a área da cidade com a inclusão das freguesias de Cedofeita e de Massarelos. Dada
a sua enorme extensão, a freguesia de Santo Ildefonso é dividida em duas, tendo
sido criada a freguesia do Bonfim, com cerca de 295 hectares.
Não podemos esquecer que, na margem esquerda do
rio, as freguesias de Mafamude e de Santa Marinha pertenciam à jurisdição do
Porto. Esta situação só é alterada após o arredondamento das freguesias passando,
a partir desta altura, a fazer parte do concelho de Vila Nova de Gaia.
Em inícios do século xix o panorama do Porto é o de uma cidade com sete
freguesias, numa área de10,6 Km². Em 1836 são anexadas à cidade por decreto as
freguesias de S. João da Foz, Lordelo e Campanhã, altura em que são retiradas
para sempre as freguesias gaienses. Com a evolução e o crescimento da cidade do
Porto ― não podemos
esquecer-nos que o século xix foi
o momento áureo desta cidade ― esta atira os seus tentáculos para a zona
mais ocidental da região sendo, por isso, natural que as freguesias da zona até
vissem com bons olhos a sua inclusão no Porto. Em 1837 a área da cidade aumenta
com a inclusão de Paranhos, ficando a mesma com uma área de 30 km², o triplo do
que contava em 1710. Em 1895 foram fixados novos limites com a junção de
Ramalde, Aldoar e Nevogilde. Finalmente, em 1898 os lugares da freguesia de
Campanhã, que ficavam na parte exterior da Circunvalação, passaram para aquela
freguesia, ficando o Porto com a fisionomia que hoje ostenta: uma cidade
cercada no seu crescimento pelo mar, pelo rio e pela Circunvalação.
Hoje a cidade do Porto tem 42 Km², 15 freguesias e
cerca de 247 000 habitantes, de acordo com o Censos de 2011, o que dá uma densidade populacional de 6 000
habitantes por km².
Mas como é que esta população evolui? E terá sido o
Porto sempre a segunda cidade do País?
Como é facilmente entendível, não é fácil
reconstituir a evolução da população da cidade desde tempos medievos, pois foi
só em 1864 que se realizou o primeiro censo com metodologia científica. Até
aqui deparamos com um longo período em que são escassos os levantamentos
populacionais. Esta situação obriga a diversos cruzamentos de dados, mas
mantemos a noção de que a fiabilidade não é muito elevada porquanto não sabemos
quais os critérios utilizados nem com que fins.
Com as ressalvas defendidas vamos tentar fazer uma
análise da população ao longo dos tempos.
No século xii
o Porto é a terceira cidade do reino. A que tem maior densidade populacional é
a de Braga (Lisboa ainda era muçulmana), com cerca de 5 000 habitantes, seguida
de Coimbra a cidade mais a sul do Portugal de então, com uma população idêntica
à de Braga. Carlos de Passos diz-nos que no período da muralha dita sueva
(agora sabemos que é tardo-romana) a população do Porto é de 2 000 habitantes mas,
como o autor não refere a fonte, atrevemo-nos a pensar que se tratava de um
número exagerado. De salientar que a população de Portugal conta, à época, com cerca
de 400 000 habitantes para uma superfície de 34 000 Km². Já com a muralha
fernandina, construída em 1376, o Porto tem cerca de 8 500 habitantes, que era
amplamente ultrapassado pela densidade populacional de Lisboa, com os seus cerca
de 65 000 habitantes, o que a torna na grande cidade do reino, marcando desde
essa época uma macrocefalia que perdura até aos nossos dias. A segunda cidade
continua a ser Braga, com mais de 10 000 habitantes, passando o Porto a ser a
terceira cidade do reino, ultrapassando Coimbra.
Em 1527-1532 D. João II decide ordenar o primeiro
censo efectuado em território nacional. O mesmo mostrou que Portugal tinha, na
época, cerca de 1 200 000 habitantes, sendo nessa altura o Porto já a segunda
cidade do país, com 13 5oo habitantes, e Lisboa cerca de 50 000 a 55 000
habitantes (era a grande cidade da península).
Em 1622, D. Rodrigo da Cunha, no seu catálogo dos
bispos do Porto, confere para o Porto 14 500 habitantes. Em 1787 foi ordenado
novo censo e o padre Rebelo da Costa confere para o Porto 63 500 habitantes.
Como já disse o primeiro censo efectuado com rigor
científico foi em 1864 e este censo mostra que o Porto conta na época com 89 349
habitantes. No censo de 1900, e já com as 15 freguesias definitivas, o Porto tem
167 955 pessoas a residir na cidade, continuando a população a aumentar até
atingir o seu pico populacional no censo de 1981, com 330 199 habitantes.
A partir desta data a densidade populacional começa
a decair, tendo a cidade no ano de 2001 apenas 262 928 habitantes. No último
censo, datado de 2011, podemos apreciar um novo decréscimo populacional para os
240 000 habitantes.
Estes números mostram-nos uma descida de mais de 60
000 habitantes em duas décadas, ou seja, uma média de 3 300 por ano.
São vários os factores que sustentam esta
decadência contínua e que são de natureza essencialmente económica, já que o
processo de terciarização do centro
levou ao abandono da população para a periferia, o que provocou o aumento dos
concelhos limítrofes, com Vila Nova de Gaia à cabeça que é, sem dúvida, o
concelho mais populoso do Grande Porto, contando com mais de 300 000
habitantes.
Mas este fenómeno afecta também concelhos como
Matosinhos, Gondomar, Maia e Valongo, que têm vindo a aperceber-se que a sua
população aumenta à custa da cidade do Porto. Este fenómeno parece não ter fim,
já que o alto preço dos terrenos na cidade provoca uma especulação imobiliária,
resultando no facto de os casais mais jovens se terem visto na necessidade de
procurar noutras paragens da Área Metropolitana do Porto casas a preços mais acessíveis.
Esta situação levou a que recentemente o
historiador Hélder Pacheco tivesse considerado que «() existe uma conspiração
contra a cidade por parte de todos os agentes que provocam a debandada da
população.», (in Porto de S. João, Vol. II)
É curioso assinalar que apenas as freguesias mais
ocidentais da cidade (as últimas a entrar para a urbe) conseguem atenuar esta
sangria. Mas este fenómeno não é exclusivo do Porto. Lisboa também sofre do
mesmo problema, tendo visto a sua população decair de uma forma sistemática
desde os anos 70. Hoje a sua população tem menos 260 000 habitantes em relação
àquela época, beneficiando essencialmente Sintra.
Em relação ao Porto, como vai longe o tempo
em que um relatório da Câmara do Porto, emanado em 1962, dizia que a cidade
tinha capacidades para ter uma população de 500 000 habitantes! Hoje tem cerca
de metade e em 2021, nos próximos censos, corremos o risco de ainda termos menos população, especialmente no Centro Histórico e na Baixa tradicional, já que os novos habitantes não devem colmatar os que partem, especialmente pelos processos de gentrificação .
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